domingo, 12 de janeiro de 2014

Bakunin, Brasil e "Brigas" políticas -- O BBB de 2014

Princesa Cristina anunciou que vai depor na Espanha sobre fraude fiscal e lavagem de dinheiro
por Ricardo Goldbach

"Indiciada por fraude fiscal e lavagem de dinheiro, anunciou neste sábado (11/01/2014) que irá comparecer voluntariamente perante o juiz.

No comunicado, pediu que o depoimento seja feito o quanto antes. Segundo informações, a data marcada seria dia 8 de março. Os advogados tinham até quarta-feira para apresentar um eventual recurso sobre as acusações que se tornaram públicas esta semana.

O caso abre caminho para um processo sem precedentes contra um integrante da realeza, revelando-se dias depois de uma pesquisa mostrar que o apelo popular da família real caiu a seu nível mais baixo."

Exato, "família real". A notícia acima, cujo texto editei propositalmente, retirando apenas as referências geográficas e patronímicas, podia muito bem se referir ao que acontece na capitania hereditária do Maranhão -- também disponível no sabor "Amapá" --, mas diz respeito à filha mais nova do rei Juan Carlos da Espanha, a princesa Cristina. Conivente com crimes do marido, ela participou do desvio de verbas públicas no valor de € 10 milhões, por meio de uma fundação que se pretendia sem fins lucrativos. Na Espanha, um crime é chamado de "crime", mesmo quado cometido por membro da realeza; não recebe o etéreo e difuso apelido de "malfeito", como ocorre entre as elites de cá.

E o que a foto de Roseana Sarney faz aqui? É homenagem à sua promoção, de governadora a diretora do comitê gestor que pretende sanar as irregularidades cometidas por... ela mesma, no exercício do cargo de governadora. Coisas da aliança da direita com a ex-querda, de modo a evitar dissabores maiores para ambas em ano eleitoreiro eleitoral.

E o que Bakunin faz no título deste post? Pensar, o que ele sempre fez, conforme se pode ler à página 178 da tradução inglesa de sua obra "Gosudarstvennost' i Anarkhiia" ("Statism and Anarchy". Cambridge University Press, Cambridge, UK. 2002):

"What does it mean, 'the proletariat raised to a governing class?' Will the entire proletariat head the government? The Germans number about 40 million. Will all 40 millions be members of the government? The entire nation will rule, but no one will be ruled. Then there will be no government, no state; but if there is a state, there will also be those who are ruled, there will be slaves.

In the Marxist's theory this dilemma is resolved in a simple fashion. By popular government they mean government of the people by a small number of representatives elected by the people. So-called popular representatives and rulers of the state elected by the entire nation on the basis of universal suffrage -- the last word of the Marxists, as well as the democratic school -- is a lie behind which lies the despotism of a ruling minority is concealed, a lie all the more dangerous in that it represents itself as the expression of a sham popular will.

So, from whatever point of view we look at this question, it always comes down to the same dismal result: government of the vast majority of the people by a privileged minority. But this minority, the Marxists say, will consist of workers. Yes, perhaps of former workers, who, as soon as they become rulers or representatives of the people will cease to be workers and will begin to look upon the whole workers' world from the heights of the state. They will no longer represent the people but themselves and their own pretensions to govern the people. Anyone who doubts this is not at all familiar with human nature."

Em minha livre tradução:

"O que significa 'o proletariado elevado à classe governante'? O proletariado inteiro estará à frente do governo? Há 40 milhões de alemães. Todos os 40 milhões serão membros do governo? A nação inteira governará, mas ninguém será governado. Assim, não haverá governo nem Estado; mas, se houver um Estado, também haverá os que são governados, haverá escravos.

A teoria marxista resolve esse dilema de forma simples. Por governo popular eles entendem o exercício do governo por um pequeno número de representantes eleitos pelo povo. Denominá-los representantes do povo e governantes do Estado eleitos pela nação com base em sufrágio universal – a última palavra para marxistas e democratas – é uma mentira por trás da qual se esconde o despotismo da minoria governante, uma mentira mais perigosa pelo fato de essa minoria apresentar-se como expressão de uma pretensa vontade popular.

Assim, seja qual for o ponto de vista sob o qual se analise a questão, tudo leva ao mesmo e desanimador resultado: uma minoria privilegiada governando uma grande maioria. Mas essa minoria, dizem os marxistas, consistirá de trabalhadores. Sim, ex-trabalhadores que, ao se tornarem governantes ou representantes do povo, deixarão de ser trabalhadores e passarão a olhar para o universo de trabalhadores do alto das posições que ocupam no Estado. Não mais representarão o povo, mas a si mesmos e seus próprios desígnios de governar o povo. Quem duvidar disso desconhece a natureza humana."
[grifo meu]

À página 94 de seu livro, Bakunin propõe:

"German and Russia simultaneously appropriated a certain sum, say a million, to carry out some purpose, such as building a new ship. In Germany, do you think it would b stolen? Perhaps a hundred thousand, maybe even two thousand, but at least eight hundred thousand would go directly to the purpose at hand, which would be accomplished with all the efficiency and the competence for which the Germans are noted. And in Russia? First of all, half of it would be embezzled, and a quarter of it would be wasted as a result of negligence and ignorance, so that at most the remaining quarter would be used to knock together something that was falling to pieces, good for show but unfit for its purpose."

Traduzo novamente:

"Suponhamos que Alemanha e Rússia destinassem ao mesmo tempo uma soma de, digamos, 1 milhão, para um mesmo propósito -- a construção de um novo navio, por exemplo. Você acha que na Alemanha o dinheiro seria desviado? Talvez 100 mil, quem sabe até 200 mil o fossem, mas ao menos 800 mil seriam diretamente gastos no objetivo original, que seria alcançado com a eficiência e a competência que caracterizam os alemães. E na Rússia? Para começar, metade do dinheiro seria desviado, e um quarto seria desperdiçado como resultado de negligência e incompetência. Desse modo, o quarto restante seria utilizado para improvisar algo que iria cair aos pedaços -- bom para ser exibido, mas incapaz de cumprir sua função."

Com o preâmbulo acima, Bakunin justificava sua descrença em um desenlace favorável à Rússia, no que dizia respeito à disputa com a Alemanha pela hegemonia militar sobre o Mar Báltico, e seguia adiante em considerações geopolíticas.

Mas, deixando de lado o "B" de Bakunin e voltando ao "B" de Brasil, nesse ano de 2014 assistiremos à disputa por outra hegemonia, esta travada pelos candidatos aos postos de "Brazil's Next Top Gangsters" nos planos estadual e federal.

Os arcos de alianças curvaram-se tanto que suas extremidades se encontraram e se encostaram: ex-querda e direita combinam evitar lá em cima (entre as elites, tão execradas seja pelo lulismo pragmático, seja pelo lulismo ignorante, mas sempre pelos apóstolos de Lula) temas cabeludos como "mensalão", "trens paulistanos", "venda do pré-sal" etc, sobrando às faceiras militâncias feiceiras e tuiteiras alugadas -- vide "Núcleos de Militância em Ambientes Virtuais", por exemplo -- o papel de baixar o nível com mais liberdade, mais virulência e mais fervor religioso.

Cá em baixo, nas redes sociais amestradas, veremos mais e mais debates(?) baseados em categorias ideológicas tais como "covardia", "entreguismo", "privatismo", "fascismo", "estatismo" e "traição", e raciocínios com premissas baseadas em sólidos fundamentos cartesianos do tipo "eles estão desesperados", "a roubalheira de antes era maior" e por aí vai. Pelo visto, pensar é coisa que custa muito, mas a alegada verba de R$ 10 milhões compra a solução das demais dificuldades.

Depois é aguardar o resultado das urnas eletrônicas brasileiras, viciáveis e engravidáveis -- tanto assim que Eduardo Paes foi proclamado prefeito do Rio de Janeiro pelas urnas de 2008 --, urnas essas que foram reprovadas e proibidas pelas dezenas de países que as testaram.

Feliz 2015, neste Brasil cujo governo se pretende bom para ser exibido, mas é (e continuará sendo) incapaz de cumprir suas funções.

PS: Uma das funções que o governo atual não cumprirá (nem qualquer outro), é a de apurar como Roseana Sarney acumulou os US$ 150 milhões que detinha em sua conta nas paradisíacas Ilhas Cayman em 1999, segundo denúncia publicada no Wikileaks em 2009. Qual a origem do dinheiro, como Roseana declarou (se é que declarou) e a quanto monta hoje o saldo da conta no Banco Julius Baer (se é que não foi encerrada), são dados que não cabem na aritmética das alianças do petismo, hoje refém de tudo aquilo que combatia quando tentava conquistar credibilidade popularidade votos poder.




Nenhum comentário:

Postar um comentário