sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Quem é essa lula?

Ricardo Goldbach

Quem é essa lula cujos tentáculos abraçam o Brasil e os eleitores brasileiros, as lições do passado e o futuro de todos nós, com tão pouca inapetência? Com tão pouca apreciação e respeito pela própria e sofrida história? Com tão pouca responsabilidade por seus atos e palavras?

Ela está no segundo mandato e ainda tento entendê-la. Ela contraria todas as normas e boas práticas da política, lançando com enorme antecedência a candidatura de sucessor, abrindo precocemente escaramuças que paralisam o cotidiano da gestão da coisa pública (res publica, república).

Ela cobra do presidente da Embraer a incapacidade de sustentar empregos e negócios em meio à maior crise econômica da qual se tem notícia. Sim, a maior. Em 1929 ainda não era possível o efeito dominó propiciado pela globalização, a alavancagem recíproca - para cima ou para baixo - favorecida pela colossal interdependência entre os mercados. Essa lula cobra, das economias mista e privada, a responsabilidade por atos de gestão, fazendo força para se esquecer de que o presidente do Brasil não é pai nem bedel de todos, fingindo ignorar que demagogia
(demos gogos, conduzir pessoas) não rima com democracia (demos kratein, poder das/para as pessoas), que suas metáforas se esvaem em instantes e não resolvem os problemas existentes, os problemas causados por um momento de ruptura sem precedentes.

Essa lula não se dá conta de que a economia planificada russa, que decidia em Moscou quantas geladeiras seriam fabricadas e vendidas nos Urais, esvaiu-se esmagada pela própria insustentabilidade, pela impossibilidade própria da meta estabelecida com tamanha onipotência. Essa lula, por não ler os textos atuais e mostrar desapreço por novas luzes, se escora numa antiguidade recente para aparentar estofo (ideo)lógico perante sua corte, igualmente inapetente e desnorteada. Essa lula não vai se aperceber de que uma terceira via é necessária, e necessariamente desvinculada dos viéses marxistas e keynesianos.

Essa lula - tal como toda a oca classe política cujos negócios não me atendem - não se dá conta de seu papel de síndico de um imenso condomínio, segundo me informa o artigo 1o., parágrafo único, da Constituição de 1988, vigente no Brasil: "Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente nos termos desta Constituição". É um condomínio cujas despesas são rateadas e pagas pelos condôminos, sem as devidas contrapartidas essenciais. As contrapartidas que evitariam a cena que vi na noite própria do massacre da Candelária, poucas horas antes do evento. Era assustadora a massa de menores ali concentrada, que vi da janela do ônibus, sem qualquer fato ou motivo que permitisse a decupagem da cena. Mas tenho certezas sobre qual mão invisível os colocou naquela condição, em um sentido ampliado.

Sou o fruto perplexo de uma geração que acreditou em mudanças. Uma geração que, como eu, serviu cerveja atrás do balcão, em festas para arrecadação de fundos para a criação do Partido dos Trabalhadores. Bons tempos aqueles, os da esperança. Eu vertia sangue quando empalmava um caco de vidro escondido em meio às pedras de gelo do freezer. Muitos outros sangues e esperanças, bem mais carregados de substância, crenças, competências e significados do que os meus, se viram igualmente a escoar em vão, abraçados sem sinceridade por tentáculos ineptos.

Sou o fruto estéril gerado por uma árvore em cujo material genético está legivel e indelevelmente gravado "niilismo". Que seja, vamos ver o diabo de perto e dançar com ele. Ainda que restem crianças, plantas, um sol e uma lua.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

O Poder do Sim

De uma pessoa que é especial para mim, recebi um texto de Osho. Eu o conheci há muito tempo - muito antes de ele deixar de ser Bhagwan Shree Rajneesh - por intermédio de outra pessoa, eternamente especial e que foi precocemente para outro plano. Compartilho aqui o texto recebido, bem como minhas reflexões.

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"O Sagrado Sim

As religiões no passado ensinaram às pessoas uma atitude negativa. As antigas religiões dependem do "não faça": não faça isto, não faça aquilo. Toda a visão delas é: como negar a vida. Pensam que negando vida estarão mais próximas de Deus, e isto é um absurdo. Vida é Deus – negá-la é negar o próprio Deus.

Necessitamos de um coração com um grande sim declarado. E o sim tem que ser tão total que contenha em si mesmo o não. A luz tem que ser tão total que a escuridão se torne uma parte dela. A Vida tem que ser tão total que a morte se torne apenas um episódio dela. E quando a pessoa pode dizer um grande sim para tudo o que existe – para a escuridão, para a luz, para as agonias da vida e para os êxtases da vida, para o corpo e para a alma, para a terra e para o céu – quando a pessoa pode dizer sim a tudo o que existe, isso se torna um sagrado sim. E meu sannyas é baseado no Sagrado Sim. É uma visão totalmente nova.

O não tem que ser dissolvido no sim. As religiões antigas eram, de alguma maneira, suicidas. Elas murcharam as vidas das pessoas. Elas eram escapistas. Não permitiram o amor, não permitiram o relacionamento, não permitiram que a multiplicidade e a riqueza da vida fossem vividas, desfrutadas, experienciadas. Elas ensinaram as pessoas a escapar da vida e de suas múltiplas experiências, a viver em monastérios, a renunciar. Elas eram baseadas no não. Toda a filosofia delas está contida no não. E a pessoa que era muito hábil na negação tornava-se um grande santo aos olhos delas. Essas pessoas tinham algo de masoquismo, eram neuróticas, mas por causa da filosofia do não, neuróticos se tornaram santos; eles eram adorados. Eles estavam se envenenando lentamente, porque quando você diz não para você mesmo, você está se envenenando.

O Sim é doador da vida. E o sim não pode ser parcial; tem de ser total. O Sim não tem que ser algo contra o não, caso contrário será parcial. Sim tem que ser tão enorme, que contenha o não em si mesmo. E quando o sim é tão enorme, tão grande, tão infinito, que é capaz de conter seu oposto, então ele se torna um Sagrado Sim.

Sannyas é um Sagrado Sim para a vida e tudo o que ela contem. E para viver com este sim é necessário coragem!

Viver com este sim significa que se está pronto para se dissolver na existência, que a gota de orvalho está pronta para cair no oceano. Mas no momento em que a gota de orvalho cai no oceano ela também se torna o oceano".

Osho, The Sacred Yes, #1

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Excelente este texto do Osho. De uma certa forma, tem muito a ver com minha atual concepção de “religião”, se é que essa categoria ainda tem algum valor – devidamente respeitados aqueles para os quais ela é importante. A minha poderia bem se chamar “teosofia”, “cosmogonia”, “antroposofia” ou simplesmente “código de conduta para a Vida”.

Caminho para minha própria religião, chamada “Viva e deixe viver”, que tem um mandamento: “Cresça, seja feliz e contribua para o máximo de crescimento e felicidade* que você puder, em torno de você”. Busco exercer isso no meu dia-a-dia, na medida do que posso.

Já faz tempo que reparei que muitas vezes, quando digo algo com o que uma pessoa concorda, ainda assim ela começa uma resposta ou um comentário por um “não”. É absurdamente automática a expressão do “não” que trazemos introjetada. Às vezes vem um “não, sim…”, num conflito interior que, apesar de explicitado, não é da ordem da consciência de quem fala. São perversos, na acepção psi, esses mecanismos dos quais custa nos livrar. Outra forma de se ver - esta é a parte boa - é que em Lógica Matemática dois “nãos” equivalem a um “sim”. Novamente, o “sim” contém o “não”.

Gostei muito da imagem da gota de orvalho no oceano, que, ainda que ínfima, torna-se parte do oceano e portanto o próprio. Aceitar e viver de acordo com isso é um belo exercício de humildade, de reconhecimento e aceitação das próprias limitações e principalmente, ao mesmo tempo, das potencialidades.


Obrigado por compartilhar.

Um beijo do

Ricardo

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* O conceito "felicidade", por si só, já mereceria um post exclusivo. Em alguma hora ele virá.



quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Não leu e não gostou?

O Globo publica, em sua edição on line de 10/02/2009, a repercussão da divulgação de teorias de Igor Panarin, especialista russo em inteligência, ciências políticas e relações internacionais. De acordo com Panarin, haverá uma fragmentação geopolítica dos EUA em 2010, decorrência do colapso do dolar como moeda de trocas comerciais.

Uma leitura dos textos originais de Panarin permite que cada um apreenda o quanto de visão ou de imaginação eles contêm. No entanto, consultar especialistas que não sabem do que se trata e emitem opinião, como o Globo faz, beira o subjornalismo:

"Embora não conheça a teoria de Igor Panarin, a professora de Relações Internacionais da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) Cristina Pecequilo disse que a idéia parece um exagero".

Que coisa.