quarta-feira, 15 de julho de 2009

Micronoticiário quente

Ricardo Goldbach

Michael van Poppel, um holandês de 19 anos de idade, é o novo fenômeno da mídia online. Ele iniciou, em setembro de 2007, um projeto de jornalismo online colaborativo, o Breaking News Online (BNO).

Poucos meses depois, Michael teve acesso, não se sabe como, a um vídeo inédito contendo uma declaração de Osama Bin Laden. O furo foi oferecido a várias agências, sendo finalmente comprado pela Reuters. O Twitter do BNO conta hoje com mais de 800 mil seguidores, uma audiência maior do que a da ABC News ou da Newsweek.

O que chama a atenção para este case é que não há trabalho de investigação e apuração, apenas o de agregação e difusão de notícias “quentes” (breaking news), a partir de uma rede de colaboradores. Operando com feeds, twitter e mensagens de e-mail, o BNO tem na web um mero ponto de presença, no site http://news.bnonews.com/i5xf

O próximo projeto do BNO é a transmissão de notícias para iPhone, a um custo estimado de 99 centavos de dolar ao mês. O aplicativo para download das mensagens custará 1,99 dolares.


Receita de sucesso para extinguir concorrência

Ricardo Goldbach*

A receita é simples: tente matar a concorrência com falsos anúncios, depois acuse-a falsamente pela mesma prática.

É enfadonhamente comum a desconexão com a realidade que acomete empresas bem-sucedidas. E, nesta época de tecnicalidades que se expandem enquanto dormimos, fica mais difícil ainda tomar as rédeas de nosso dia a dia. A onipresente Microsoft é um caso típico de avassalador cinismo e descaso em relação à clientela - praticamente o planeta inteiro. Esta constatação não é parte de nenhuma campanha de difamação: a Microsoft não precisa de detratores, pois dá conta do recado sozinha.

A companhia cresceu à sombra de práticas predadoras, desde a cópia da interface do Windows como a conhecemos - idéia original da Apple, baseada em objetos e mouse - até a destruição dos negócios de pequenos concorrentes. Usuários do PC-XT, por exemplo, conheciam um ótimo software de desfragmentação de disco, o OPTune, da Gazelle Software. Através de acordo, a Microsoft absorveu o OPTune, incorporou-o - com menos funcionalidades (possibilidade de alteração do interleave de setores, por exemplo) - ao MS-DOS 3.1, e o OPTune independente sumiu. A concorrência saudável desapareceu, assim como era comum sumirem os dados de muitos usuários do péssimo desfragmentador que passou a vir embutido no MS-DOS.

Após terem cometido coisas como o Windows 95 ou o Bob (alguém já ouviu falar desta interface criada por Melinda Gates, esposa de William?), os hunos de Redmond conseguiram finalmente inovar: ao saberem que a concorrência trabalhava em algo, passavam a anunciar - para dentro de meses - produtos superiores, que jamais iriam lançar ou lançariam anos depois. Como consequência, o mercado, sempre de olho num produto com a grife MS, dava preferência ao que não viria, e a concorrência era desestimulada. Esta prática foi muito comum nos anos 80 e 90, mas resiste até hoje. Às vêzes ela nem se destina à aniquilação da concorrência, apenas a iludir consumidores ou encobrir incompetências - como é o caso do WinFS; presente nas especificações do Longhorn em 2004, o supostamente inovador sistema de arquivos sumiu quando aquele sistema operacional, já batizado como Vista, foi lançado em janeiro de 2007. No decorrer daqueles três anos de expectativas em suspenso, cunhou-se, para o Longhorn, o merecido apelido de "Longwait". Já em tentativa de esmagar a concorrência da Novell no segmento de redes, o Microsoft Windows NT 5.0 (ou Windows 2000) teve seu lançamento adiado por três anos, numa estratégia comercial alavancada por problemas técnicos.

Mas o que a Microsoft fez, ao instalar-se confortávelmente na poltrona do virtual monopólio? Passou a ignorar controles de qualidade e marketing (estudo das necessidades do mercado, não confundir com publicidade), perpetrando produtos como o Vista, um erro desde o surgimento; além da ausência de características prometidas (como o WinFS), faltou comunicação proativa com fabricantes de periféricos e respectivos device drivers. Como consequência, era impossível fazer funcionar webcams, scanners, placas de áudio ou vídeo e por aí vai. E o que a Microsoft fez, ao detectar o desastre anunciado? Tentou ganhar fôlego financeiro, inflando artificialmente as vendas do Vista, empurrando-o em operações de venda casada ao redor do mundo, embutido em equipamentos novos. Ouvi pessoalmente a confirmação desta prática, vinda de um atendente de suporte da Dell. Segundo esta fonte, havia um acordo com a Microsoft, no sentido de que a Dell não fornecesse suporte técnico a clientes que optassem pelo XP pré-instalado, ao invés do Vista. Comprador de Vista tinha suporte, comprador de XP não. E, por recusa a fornecer suporte, entenda-se também a recusa em disponibilizar device drivers para instalação de periféricos sob o XP... Assim é fácil vender mais algumas dezenas de milhões de réplicas de um ôvo podre, não é?

Mas tem mais: falhas crônicas e já detectadas no projeto de componentes como o ActiveX ou do Internet Explorer têm sido e continuarão sendo portas escancaradas para ataques de hackers de chapéu preto (os black hats, que se opõem aos white hats, os do bem). O mundo gira e recebo, neste 15 de julho, um alerta de segurança da Computerworld (mais um...), reportando que
"A Microsoft divulgou nesta terça-feira (14/7) seis atualizações de segurança para corrigir nove vulnerabilidades em seu pacote mensal de correções, conhecido como Patch Tuesday".
Uma das falhas corrigidas neste patch é um
"bug no controle ActiveX [que] havia sido relatado à Microsoft há mais de 15 meses" [grifo meu].
Esta brecha que afetava o Internet Explorer e da qual a Microsoft tinha ciência há mais de um ano, vinha sendo cada vez mais explorada em ataques a usuários nos últimos tempos. Já o conserto de outra falha, que também afeta a segurança de usuários do IE, porém descoberta na véspera da distribuição do pacote de remendos, vai ficar para uma outra ocasião. Não parece coisa de quem precise concorrer para sobreviver.

Mas, juntando o desleixo ao condenável, nesta mesma data Steve Balmer, CEO da Microsoft, declara que o anúncio do Chrome OS é "vaporware", segundo o IDG Now. Ora, vaporware é o nome que se dá àquela prática lapidada pela Microsoft, de prometer o que não entregará, visando prejudicar a concorrência. É o software vapor, aquele que se desmancha no ar, que não se pode tocar e muito menos utilizar.

Apenas para alinhar os ponteiros, o Chrome OS é um sistema operacional projetado pelo grupo Google para utilização em netbooks, um forte concorrente de uma futura versão light do Windows 7, o sucessor do Vista. Após o lançamento do Android, para celulares e smartphones, o Google investirá em computadores propriamente ditos, de olho também no mercado de notebooks e desktops.

Mas Balmer vai mais longe e diz que "pelo que sei você não precisa ter dois sistemas operacionais. É bom ter um". Como assim, Steve? Windows Mobile 6.5 (lançado em maio de 2009), Windows Mobile 7 (já anunciado como sucessor do recém-lançado 6.5), Windows HPC Server 2008, Windows Server 2008, Windows Home Server(!), Windows Vista, Windows 7 (que tampona provisoriamente o fiasco do Vista), Windows Azure (voltado a cloud computing, com lançamento previsto para 2010)... as superposições na linha do tempo não são poucas. A Microsoft observa tanto o quintal dos vizinhos, buscando cachorros pequenos, que mal sobra percepção para o elefante às suas costas.

Skype x Messenger, Gmail x Hotmail, Firefox x Internet Explorer, Android x Windows Mobile, Thunderbird x Outlook, Linux x Windows... é bom viver num mundo tecnológico que seja ao menos dual. Um concorrente não desprezível do Windows em alguns nichos de utilização, o Linux é - como talvez o Chrome OS venha a ser - um dos alvos prioritários do desdém da Microsoft e da massa de ecos de um mercado que parece anestesiado. Se Linux fosse realmente um brinquedo hermético de nerds, como se diz, a IBM não se daria o trabalho de pré-instalá-lo em máquinas como o IBM 390, como no caso da Caixa Econômica, por exemplo; ainda que a Caixa use a plataforma OS 390 naquele monstro configurado em dupla redundância, ele é simplesmente o responsável pelo processamento de toda a área não-bancária da Caixa - coisa de gente grande.

Já as táticas fabris, mercadológicas e publicitárias da Microsoft, estas continuam sendo coisa de gente eticamente pequena.

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* O autor tem mais de 30 anos de experiência em TI, em ambientes de
mainframes, minicomputadores, supermicrocomputadores e microcomputadores, nas atividades de levantamento de requisitos, projeto, desenvolvimento, testes e homologação de sistemas, suporte, administração de dados e de bancos de dados, treinamento e coordenação de equipes de desenvolvimento.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

A artista plástica Lena Bergstein expõe no Rio





Lena Bergstein é pintora, gravadora, professora de desenho e gravura, e programadora visual. Mora no Rio de Janeiro, onde nasceu.

Cursou o Instituto de Belas Artes (hoje Escola de Artes Visuais) e o atelier de Gravura do Museu de Arte Moderna do Rio;

Participou das mais importantes bienais de gravura nacionais e internacionais, como Curitiba, Ljubljana, Miami, Fredrikstad, Bradford, Taiwan e Montevideo;

Expôs gravuras e pinturas na Petite Galerie, pinturas na galeria Cândido Mendes, montou a instalação Tenda no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Expôs pinturas e os originais do livro "Enlouquecer o Subjétil" no Paço Imperial;

Expôs ainda na Galeria Segno Grafico (Itália), Centro Internazionale di Grafica (Itália), Biblioteca Wittockiana (Bélgica), e Galeria Debret (Paris);

Morou dois anos em Paris, onde participou dos seminários de Jacques Derrida: "Questions de Responsabilité: Du secret au témoignage" e "Hospitalité et Hostilité";

Ganhou o Prêmio Jabuti pela melhor produção editorial de 1999 com o livro "Enlouquecer o Subjétil", criado em parceria com Jacques Derrida;

Lecionou técnicas alternativas de gravura e iniciação à gravura na PUC/RJ, entre 1980 e 1983;

Lecionou desenho de observação, no Departamento de Artes da PUC/RJ, entre 1997 e 1998;

Deu aulas na Escola de Artes Visuais do Parque Lage;

Apresentou, em janeiro de 2003, "Tramas", exposição de pinturas na Sílvia Cintra Galeria de Arte, e "Amarelo Cromo", exposição de gravuras, no Museu da Chácara do Céu;

Expôs telas e gravuras, no Istituto Ítalo Latino-Americano (Roma) e na Scuola Internazionale di Gráfica (Veneza), em 2004;

Participou da exposição coletiva “Só Pintura”, na galeria Mercedes Viegas, Arte Contemporânea, em 2006;

Participou da exposição “Manobras Radicais” no CCBB de São Paulo, em 2006;

Expôs "A Escrita do Silêncio", em 2004, no Solar de Grandjean de Montigny (PUC-RIO), trabalho sobre o qual escreveu:


A Escrita do Silêncio

Muitas coisas se passaram nesses últimos anos e meu trabalho foi gradualmente mudando. Reparei que as escritas de letras e palavras que impregnavam o trabalho foram se tornando mais espaçadas, mais esgarçadas, e foram pouco a pouco desaparecendo, dando lugar a uma outra escrita, bem diferente, mas que já aparecia pontualmente em desenhos e telas anteriores. Eram costuras, primeiro à mão, depois à máquina, à mão e a máquina, uma tessitura de pontos, linhas, nós, cerzidos, alinhavos, pespontos, pontos em ziguezague.

Se a escrita fonética de textos e palavras me parecia agora excessiva, barulhenta, as costuras a substituíam por um certo silêncio, uma pausa, um vazio povoado de possibilidades."Este é um livro silencioso, e fala, fala baixo", escreve Clarice Lispector, ou ainda como diz Rabi Nahman de Bratislav, numa de suas parábolas, "ele tocava um violino mudo - ou quase, pois o rei acabou por captar uma nota extremamente delicada".

O único ruído que se ouvia era o toque toque toque, da máquina costurando, os ritmos cadenciados do costurar, do cerzir, do levantar a sapatilha que, por sua vez, levantava a agulha e a linha principal, o retrós, do virar o tecido mudando o rumo da costura. Às vezes era necessário enrolar outra vez a linha da carretilha, ou bobina, que ficava embaixo do retrós. O ruído da carretilha enrolando a linha a toda velocidade e depois recolocá-la numa espécie de caixinha, fechar a tampa, abaixar a sapatilha, descer a agulha e a linha e outra vez toque toque toque.

Apesar de não se chamar retrós ou linha mestra, era a linha mais fina da carretilha (ou bobina) que dava solidez e consistência à costura. Mesmo que só aparecesse inteiramente no avesso do tecido, era ela que estruturava a costura e que a prendia ao tecido, arrematando-a.

A busca de uma extrema simplicidade, um quase nada trabalhado que desse a impressão de um se despir, era a trajetória que o trabalho tomava. E eu o seguia.

Através dessas linhas trançadas e costuradas, uma outra questão foi de repente vislumbrada. No texto Un Ver à Soie, de Jacques Derrida, do livro Voiles, me fascina a frase "une femme tisserait comme um corps secrète pour soi son propre textile". Comecei a pensar que a partir das linhas costuradas estaria tecendo uma tessitura, uma veste, um xale, o meu próprio, o meu xale.

Esse xale seria de um tecido da Babilônia, do linho mais puro, bordado de jacintos, de anêmonas violetas, de escarlate e de púrpura, das flores silvestres que traziam o índigo. Seria têxtil, táctil, "doçura mais doce que a própria doçura", uma outra pele, incomparável a qualquer outra pele. Ele não velaria nem esconderia, não mostraria nem anunciaria - ao contrário, ele traria a memória.

Meu xale, todo singular, sensível e calmo, que ia se criando a partir do meu trabalho, uma manufatura de telas, um entrelaçar de fios e fibras...

A leitura do texto Un ver à soie foi da ordem de um acaso, de um encontro que estimula e provoca, que vem se acrescentar a uma elaboração já em andamento abrindo novas nuances de horizontes possíveis. Ampliou minha relação com as tramas, as urdiduras, a tecelagem, fios torcidos e retorcidos, trançados, tecidos sucessivos e infinitos.

O que também ecoou dentro de mim, e "que se joga no tecido desse texto", é sua relação com o fazer da arte, com a criação, ao mesmo tempo com a subjetividade do artista. Constante e lenta elaboração, no diminuir e aumentar os pontos de uma trama, no fazer e desfazer das malhas. Transformação incessante e permanente, pela qual as coisas se criam e se dissolvem em outras coisas, algo que não é, mas se torna, que existe em constante alteração. Um se perder e se reencontrar, nascimento contínuo, que conduz a arte através da noite, mais longe que o visível ou o previsível, experiência muda de um sentido mudo.


sábado, 4 de julho de 2009

Jânio Quadros - um acerto e um erro

Ricardo Goldbach

Em saborosa matéria de Augusto Nunes sobre Jânio Quadros, publicada na Veja de 4 de junho de 1980, um box traz impressões do ex-presidente sobre pessoas e temas.

É impressionante constatar, neste final da primeira década dos anos 2000, como Jânio conseguiu acertar e errar tanto, ao mesmo tempo.



reprodução do acervo digital da revista Veja, originalmente sem as marcações