sábado, 26 de julho de 2014

Oswaldo Aranha faz falta

por Ricardo Goldbach

Foto: Reuters
Não demorou nada para a diplomacia brasileira baixar mais ainda o que já não estava no alto: o nível dos comunicados oficiais de estados-nações (é bom lembrar que não se trata – ou se trata?   de briga entre torcidas).

A coisa começa com a disparidade do número de mortos nos dois lados do atual conflito no Oriente Médio. O governo Dilma Rousseff, que inicialmente (17/7) condena os ataques bilaterais, apelando para o bom senso dos litigantes, muda de vento e poucos dias depois (24/7) acusa Israel de "uso de força desproporcional". 

Em 25/7, no dia seguinte, o porta-voz da chancelaria israelense, Avigdor Lieberman, diz, textualmente, que:
"Essa é uma infeliz demonstração de por que o Brasil, um gigante econômico e cultural, se mantém um anão diplomático. O relativismo moral por trás desta medida transforma o Brasil num parceiro diplomático irrelevante, que cria problemas em vez de contribuir para soluções."
No mesmo dia, o Brasil chama seu embaixador em Israel para consulta, velho clichê diplomático para "estou esfriando nossas relações".

Israel se explica sobre a desproporcionalidade, dizendo algo como "há desproporcionalidade em um placar de 7 a 1, mas não estamos falando de futebol". Eu acho que entendi a mensagem: o placar sinistro só estaria empatado caso Israel desativasse suas defesas antimísseis. Desse modo, os milhares de foguetes disparados contra Israel teriam feito milhares de vítimas – 2.000 a 2.000 no placar, e a diplomacia brasileira, que mostra prescindir de diplomatas, voltaria a dormir sobre um muro bem menos incômodo.

No dia seguinte, entretanto, Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, mostrou que dos jornais só leu as manchetes, que diziam "Israel chama Brasil de 'anão diplomático'", fora do contexto (é claro, manchete não tem espaço para contexto), e mostrou-se um calouro em alfinetadas diplomáticas. Subiu (desceu?) o tom na quadréplica ao porta-voz da Chancelaria de Israel, Yigal Palmor: "ele é o sub do sub do sub do sub do sub do sub". No meu entendimento, a bravata burra de Garcia equivale às grosserias berradas contra Dilma na abertura da Copa da Fifa recém-encerrada – coisa vulgar, violenta e vazia. Mas Garcia, isso não é arquibancada de futebol...

Hoje, 25/7, a diplomacia brasileira diz que está reagindo a ação de Israel. Reagindo a quê? Segundo minha memória, quem reagiu foi o comunicado que fez questão de relativizar o "7 a 1" que veio depois do sucinto "anão". E é de se lembrar que o início do recrudescimento das tensões deveu-se ao sequestro e assassinato a sangue frio, por palestinos, de três adolescentes israelenses, Gil-Ad Shaer, Naftali Fraenkel e Eyal Yifrah. Em reação a essas mortes, três radicais israelenses sequestraram e mataram um jovem palestino, Mohammed Abu Khder. Os três criminosos israelenses estão presos, aguardando julgamento. E isso escala facilmente para a reação à reação à reação à reação... e assim voltaremos a Adão e Eva.

Ou podemos voltar apenas à Resolução 181 da Onu, de 29 novembro de 1947, que estabeleceu a Partilha da Palestina. Aquela decisão foi violada em 14 de maio de 1948, enquanto as tropas britânicas ainda se retiravam da região, por uma coligação militar composta por Síria, Egito, Líbano, Jordânia e Iraque  com apoio de Iêmen e Arábia Saudita , que tinha a manifesta intenção de "empurrar Israel para o mar". Se é para condenar violação às resoluções da Onu, pode-se muito bem começar por aí. Daí em diante, é "reação à reação à reação à reação..."

Agora Oswaldo Aranha é lembrado pelo coro midiático que reage à síntese de "anão diplomático" como sendo o responsável-mor pela criação do Estado de Israel ("não há nada de 'anã' na diplomacia brasileira!", grita-se). É fato insofismável, mas é fato do passado. Duvido que Aranha deportasse atletas cubanos em busca de asilo no Brasil, ou que endossasse as inacreditáveis palavras do ex-presidente Lula em 9 de abril de 2013, referindo-se a Mahmoud Ahmadinejad, o ex-mão de ferro do Irã: "se ele [Ahmadinejad] diz que vai  processar urânio para fins pacíficos, não temos por que duvidar". Não, não mesmo. Oswaldo Aranha estava mais para a diplomacia do que para o MMA verbal de Marco Aurélio Garcia. Não adianta tentar trazer Aranha para o palanque dessa triste comédia. Decididamente, o diplomata Oswaldo Aranha faz falta.

PS: quem quiser ver que tipo de desinformação distorce compreensões, basta googlar "Pallywood", o apelido de uma indústria de fraudes jornalísticas que mais prejudicam do que ajudam a causa palestina.

Pallywood é o braço de comunicação de grupos assassinos que só não se matam entre si de vez porque conseguiram inventar uma guerra mais rentável, a jihad contra Israel. Mudando de nomes, mas com as mesmas motivações, usando escudos humanos e bombardeando escolas e lanchonetes, de pai para filho, desde 1948.

PS2: Como amostra de como a desinformação leva gente assim como a correnteza leva gado – mesmo que não haja má-fé , lembro que há alguns anos um professor da PUC-RJ, o renomado físico Jean Pierre von der Weid, chegava à sua casa, no Jardim Botânico, quando foi rendido por dois assaltantes. Os criminosos invadiram a residência, espancaram e imobilizaram o professor, estupraram sua esposa e partiram levando bens saqueados. Alguns anos se passaram e, diante da divulgação do retrato do "pedreiro" na mídia, o casal de vítimas reconheceu de imediato um dos algozes. Ele mesmo, o hoje "herói" Amarildo. Minha fonte é uma diretora aposentada da PUC-RJ, cujo nome reservo-me o direito de omitir. 

Resumindo a história: se a polícia tivesse conseguido prender o estuprador do passado, a sociedade desinformada não teria seu "herói" de hoje. Tudo é claro quando não é escurecido.



Abrindo comportas na economia -- irrigação ou inundação?

por Ricardo Goldbach

Não sou economista, mas de vez em quando me pego pensando nos humores dos nossos dinheiros. Melhor dizendo, naqueles que determinam os humores dos nosso dinheiros.

Como dizia Goulart de Andrade, vem comigo: os bancos são obrigados a depositar no Banco Central um percentual específico dos depósitos à vista. Dessa forma, o governo controla a liquidez da economia brasileira, com injeção ou retirada de recursos. Figurativamente falando, trata-se de um "pulmão", que encolhe ou expande na medida da necessidade.

Mas vai que nesses tempos de inflação em disparada, de juros recordistas, de economia em contração e de população endividada (e de urnas à vista, não nos esqueçamos), que tipo de genialidade nos é apresentada? Abrem-se hoje as comportas do pulmão, injetando R$ 45 bilhões... inicialmente, nos bancos. Os bancos emprestarão esse novo dinheiro, a juros altos, a uma clientela endividada e aflita com a inflação, para...

... "para aquecer a economia, pois os juros deverão cair", dizem os tecnocratas e a mídia amestrada. "Entrará dinheiro na economia, com aumento do consumo, com o consequente reaquecimento das indústrias, que gerarão empregos para empregados que comprarão mais, com o que ensejarão aumento de recolhimento de impostos..." Só faltou combinarem com os russos, porque esse esquema tático pode embolar o meio de campo e beneficiar apenas...

... apenas a indústria do ágio oficializado, dos bancos que exibem lucros sempre crescentes, quer sob gestão FHCista, quer Lulista. Para que essa indústria seja a primeira a se reanimar. Depois virão os empréstimos para pessoas físicas ("se a parcela couber no bolso, pago os juros que forem") e jurídicas ("é isso, encolher, ou – pior --, fechar as portas"). Tipo pirâmide, entende? Quem entra por último nunca se dá bem. Como dizem os analistas de economia, quando não têm o que dizer, resta esperar para ver o que acontece.


sábado, 12 de julho de 2014

Praticamente tudo já foi dito sobre a Seleção do Felipão

mas me ocorrem uns drops sobre a Selecinha do Felipinho

por Ricardo Goldbach

Logo de cara, gol contra

Dizem que aos dois minutos do 1º tempo van Persie bate um pênalti e marca o 1º gol da Holanda. Para mim, foi gol contra de Thiago Silva, pela leviandade, pela imaturidade, pela molecagem de ter puxado a camisa de van Persie a centímetros da entrada da grande área.

Piada pronta

Ao 16 minutos, em bela finalização, Daley Blind marca o 2º gol da Holanda. Está tão fácil bater no Brasil, que até cego faz gol.

Humilhação

Enquanto escrevo, durante o intervalo da partida, a seleção holandesa está no vestiário e com todo o direito de sentir-se humilhada. Afinal de contas, só 2 x 0?

Substituições

Um jogador contundido ou que tenha rendimento baixo é substituído durante o jogo; juíz e auxiliares, imagino, devem ter backup, pois também pode acontecer de se machucarem com gravidade. E quanto a um técnico como o Felipinho, que vê qualidades, boa campanha e bons resultados onde ninguém mais vê? Não deveria poder receber cartão vermelho, dando lugar a um técnico do banco?

Os Céus me pouparam

Mal começa o 2º tempo, cai a Net. Que Cristina Kirchner, conterrânea do Papa, nos proteja a todos. 

Vaias

A Net volta a tempo de eu ver o time do técnico Luiz Felipífio Scolari receber as merecidas vaias pelo 3 x 0 que a Holanda escreveu no placar. Vaias essas que partiram da mesma "elite branca" que vaiou a presidente Dilma, essa que finge que não é branca, muito menos elite. Afinal, todos sabem que pobre não pode assistir final de Copa no Maracanã, por maior que seja o apagão moral do PT, time composto por uma elite de brancos -- e asseclas de outros partidos, de todas as cores e credos morais -- que insiste em fingir que não ouve a vaia das ruas.

Sem ilustração

Este post vai sem ilustração. Não há o que ilustrar.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

O depois não existe

sobre Ivan Junqueira e Dylan Thomas

 por Ricardo Goldbach




Há cerca de dois anos, revisando a tradução legendada do filme “A Love Song for Bobby Long”, empaquei com o texto do tradutor. Em dado momento, Bobby, interpretado por John Travolta, recita o poema “To Others than You”, de Dylan Thomas, cujos versos iniciais são:


Friend by enemy I call you out.
You there, with a bad coin in your socket,
You my friend there with a winning air
Who palmed the lie on me when you looked
Brassily at my shyest secret

No 2º verso, o tradutor escreveu “Você aí, com pés de barro”, mas não fiquei convencido. Tudo indicava a possibilidade de tratar-se de uma expressão idiomática – regional ou não , mas “pés de barrro” soou longe demais.

Googlei possíveis significados da expressão, e a maioria de blogs e sites de legendagem amadorística reproduzia os tais “pés de barro”. Não satisfeito, resolvi consultar tradutores (com “T”) que tivessem se debruçado sobre a obra de Dylan Thomas.

Busquei e encontrei o acadêmico Ivan Junqueira (cadeira 37 da ABL), crítico, poeta e tradutor consagrado de Dylan Thomas e Baudelaire, que havia transposto aquele verso para “Tu com tua falsa moeda”. Apesar de o dever profissional me impôr aceitar a tradução de Ivan, eu ainda não estava satisfeito.

Fui atrás das origens de Thomas, nascido no País de Gales, e descobri que em pequenas cidades galesas diz-se que não adianta tentar se livrar de uma moeda desgastada ou defeituosa (a bad coin), pois ela sempre voltará: é usada para pagar a conta da padaria, o padeiro usa-a para pagar o leiteiro, que por sua vez paga o sapateiro... Em algum momento, a moeda retorna à origem. Não adianta insistir; ela sempre volta, por mais indesejada que seja. É uma boa imagem, essa, que tanto pode estar por trás do verso de Dylan, como pode não estar.

O fato é que somente graças à Internet eu pude conhecer o dito popular galês. Ainda me resta dúvida quanto ao porquê de “socket”, mas isso são outros quinhentos. Ocorreu-me então que, como não havia Google à época da tradução de Junqueira, seria interessante conversar com ele sobre repensar traduções literárias consagradas, dessa vez à luz das pesquisas hoje viabilizadas pela Internet, em busca de revisões plausíveis.

Sempre pensando em expôr minha ideia a  Ivan, não o fiz. Nem o farei mais; os jornais informam que Ivan Junqueira se foi, neste 3 de julho de 2014. 

Me dou conta de que, se o “ótimo” é inimigo do “bom”, o “depois” é o inimigo do “para sempre”.