Ricardo Goldbach
De molho, com o pé quebrado e embrulhado em quilos de gesso, dedico-me ao ócio passivo nessa noite de segunda-feira. Isso, esse mesmo. Presto atenção àquele aparelho de promoção eletrônica do emburrecimento coletivo, a televisão (que Mike costuma chamar de "telementirão").
Está começando o "XPTO em Pauta", naquele canal que borra visualmente toda e qualquer referência a marcas comerciais que não contribuam para o caixinha da empresa, mesmo que se trate de matéria jornalística. Nada de marca de tênis em camiseta de entrevistado, nada de logotipo em caminhão que apareça distante, ao fundo de uma tomada. Portanto, "XPTO em Pauta", mesmo.
Divirjo, mas volto ao assunto. A ex-estagiária começa a falar. Passados menos de 2 minutos, ouço algo como "A chuva em São Paulo ela causou muitos estragos". Repito mental e inutilmente a mesma pergunta de sempre. Como assim, "A chuva ela"? A "chuva" já não é sujeito de oração o suficiente? Que diabos "ela" está fazendo aí? Está bem, está certo: é o modismo -- que batizo de "pronomismo" --, sucessor do gerundismo que assolou o dócil rebanho há algum tempo, o mesmo gerundismo que já mereceu o deboche dos pronomistas de agora... E Jorge Benjor vem vindo, do fundo da minha mente: "♫ Os pronomistas estão chegando, estão chegando os pronomistas ♪" Mentira, eles estão aí já faz algum tempo, da presidência da república ao balconista de boteco.
Preparo-me para o que possa vir em seguida (e sempre vem). Bingo! Sou informado de que as condições meteorológicas de São Paulo causaram "raios e descargas elétricas". Hein? Raios e descargas? Que raios as descargas fazem aí, se já há raios? Não tem jeito; como dizia o sábio Vicente Matheus, quem está na chuva é para se queimar. E, com essa chuva de São Paulo, haja queimação.
Queimo-me pois, à luz do Sol, sem filtro e sem piedade. Vai que, à luz dos refletores, a mesma criatura dispara, certeira e confiante: "A vitamina D vem do Sol". Catzo! E eu que achava que do Sol vinham apenas ejeções de massas coronais, raios gama, infravermelhos e ultravioletas, fótons e outras partículas e raios menos votados.
Desisto. Desligo. Não sou da geração "Chaves", mas penso que o mexicano e sua trupe deviam ser coisa mais instrutiva do que isso aí em cima, do que esse neojornalismo de improviso, exercido por despreparados. Afinal de contas, pensar não custa nada e dói menos que injeção.
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