Acontece de novo, acontece sempre; na esteira do sensacionalismo que cerca (mais uma) ressurreição ameaçadora das "superbactérias", a mídia tradicional aposta no de sempre: em nome da pressa e do despreparo, veicula desinformação. Nas últimas semanas tenho lido que "A superbactéria KPC (...)"
Para, para por aí. KPC é a abreviatura de Klebsiella pneumoniae carbapenemase, mas a bactéria propriamente dita atende pelo nome de Klebsiella pneumoniae. Carbapenemase é a enzima produzida pela bactéria KP. Logo, KPC é o nome da enzima, não da bactéria. Não havendo como desenhar isso mais claramente, sugiro consulta a fontes sérias (atenção, Globo e Band: Wikipedia não vale).
Surpreendentemente, o dr. Drauzio Varella também não pode ser considerado referência técnica válida neste quesito. Por outro lado, a "Avaliação fenotípica da enzima Klebsiella pneumoniae carbapenemase (KPC) em Enterobacteriaceae de ambiente hospitalar", trabalho científico publicado no Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial, está disponível na biblioteca eletrônica Scielo, para quem se dispuser a apurações mais consistentes.
Igualmente, a Anvisa se mostra mais merecedora de crédito quando descreve a KPC:
"Essa enzima pode ser produzida por vários tipos de enterobactérias (bactérias que estão presentes no trato gastrintestinal ) e o conhecimento científico tem demonstrado que ela confere às bactérias uma resistência ainda maior aos antibióticos, podendo inativar penicilinas, cefalosporinas e monobactâmicos.
A enzima KPC já foi documentada em diferentes bactérias, como Salmonella enterica, Enterobacter sp, Enterobacter cloacae e na própria Klebsiella pneumoniae, que pode agir como uma bactéria oportunista em pessoas que estão com a saúde muito debilitada, provocando infecções graves no ambiente hospitalar."
Ouvi também, em noticiário de TV, que "A bactéria KPC é uma variante mais branda da bactéria KP", mas isso já se encontra abaixo do mau jornalismo; com boa vontade, é exercício ilegal de uma profissão que, definitivamente, não admite "chutes" nem palpites desinformados.
Em tempo: o mau uso e o abuso de antibióticos levaram a espécie humana a um ponto de não-retorno, mesmo que os grandes laboratórios decidissem gastar novas fortunas no desenvolvimento de novos antibióticos. A princípio, há preferência por investimentos em fármacos de uso continuado, que gerem fluxo de caixa positivo e estável ao longo do tempo. Mas, mesmo que um "super-antibiótico" fosse disponibilizado amanhã, ainda assim continuariam havendo mau uso e abuso, o consequente desenvolvimento de cepas de bactérias mais resistentes, etc, etc.
Em 2010, a então coordenadora da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar da Clínica São Vicente (CCIH) e Gerente de Risco do Instituto Nacional de Cardiologia, Marisa Santos, afirmou durante entrevista que me concedeu:
"Menos antibióticos devem ser usados, ou voltaremos à era pré-antibióticos, quando as infecções não eram passíveis de tratamento e controle."
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